MATRIMÓNIO À ITALIANA (1964)
“Filumena
Marturano” é a peça teatral de Eduardo De Filippo, adaptada a cinema por Renato
Castellani, Tonino Guerra, Leonardo Benvenuti e Piero De Bernardi, que está na
base desta comédia de costumes que Vittorio De Sica realiza em 1964, com
excelentes resultados de bilheteira e um algo surpreendente sucesso de crítica,
não tanto em Itália (e nalguns países europeus, onde a crítica marxista
ortodoxa não perdoa a De Sica o aligeirar de tom), mas sobretudo nos EUA, onde
foi nomeado para Oscars, para Melhor Filme em Língua não Inglesa, e para Melhor
Actriz.
Durante a II
Guerra Mundial, com a Itália dilacerada pelo conflito e enjaulada no fascismo
mussoliniano, Domenico Soriano (Marcello Mastroianni), um sedutor homem de
negócios que se vai desenvencilhando bem das dificuldades, sabe-se lá como, mas
calcula-se, consegue equilibrar com agilidade essa actividade com a de
conquistador barato, que vai levando à certa as garotas com que se cruza. Uma
delas, Filumena Marturano (Sophia Loren), encontra-a numa casa de passe, numa
noite de bombardeamentos, e ficam
clientes um do outro. As visitas intensificam-se no bordel, mas depois Domenico
põe casa a Filumena e sabe-se que vivem felizes por 22 anos. Quando, porém,
Filumena descobre que Domenico está para casar com outra, encena um ataque de
coração fatal e, às portas da morte, com médico e sacerdote no quarto, leva
Domenico a casar com ela. Mas a assinatura está feita, a doente imaginária
arrebita e confessa a artimanha ao seu agora marido que não acha graça ao
estratagema. Há um plano magnífico, com Domenico ao telefone, assegurando que a
agora sua mulher está pronta a ir para o outro mundo, quando surge no fundo do
enquadramento o fantasma dessa moribunda Filumena, que afirma convictamente que
está bem viva, graças a Deus!
Depois de várias
peripécias, Filumena aceita desligar-se do compromisso, mas tem em mente uma
outra artimanha. Revela finalmente a Domenico que tem três filhos, e sem
indicar qual, acrescenta que um deles é filho dele. Claro que o galã sedutor
sente a voz do sangue, quer auxiliar o filho, mas… por qual optar?
A peça de Eduardo
De Filippo é um clássico da comédia de costumes italianos, põe a descoberto
muito da vida quotidiana da sociedade italiana do pós-guerra, denunciando o
marialvismo e o que com ele se encontra relacionado, oferecendo uma crítica
contundente por um lado, mas enternecedora por outro. O filme de De Sica
serve-se com agilidade desta estrutura para fazer sobressair a interpretação de
dois dos actores de eleição do cineasta e de toda a cinematografia transalpina,
Marcelo Mastroianni e Sophia Loren, ambos transbordantes de vitalidade e de
talento, em duas composições brilhantes.
Claro que este já
não é o Vittorio De Sica da época do neo-realismo duro e puro. É um cineasta
habituado ao que outrora combatera, grandes histórias, actores que são vedetas
internacionais, grandes orçamentos, muita cor e alegria, mesmo a tratar os
temas mais delicados. Estamos já no domínio do que se chamou a comédia à
italiana, que tantos e tão bons produtos nos deu nos anos 50, 60 e 70, entre os
quais algumas obras-primas. Não será o caso deste “Matrimónio à Italiana” que,
todavia, não mereceu as críticas ferozes de alguns dogmáticos de então e
sobrevive ainda hoje com frescura e espontaneidade, recortando com bonomia
quadros da vida diária. Muito boa a partitura musical de Armando Trovajoli e a
bela fotografia de Roberto Gerardi.
“Matrimonio à
Italiana” ganhou o David di Donatello de 1965 para melhor realizador e também o
de melhor produção (Carlo Ponti). Alcançou ainda o Globo de Ouro do mesmo ano
para filme do ano e viu nomeados Sophia Loren e Marcello Mastroianni para
melhor actriz e actor de comédia ou musical.
MATRIMÓNIO À ITALIANA
Título original: Matrimonio all'italiana
Realização: Vittorio
De Sica (Itália, França, 1964); Argumento: Renato Castellani, Tonino Guerra,
Leonardo Benvenuti, Piero De Bernardi, segundo peça teatral de Eduardo De
Filippo ("Filumena Marturano"); Produção: Carlo Ponti, Joseph E.
Levine; Música: Armando Trovajoli; Fotografia (cor): Roberto Gerardi; Montagem:
Adriana Novelli; Design de produção: Carlo Egidi; Decoração: Dario Micheli;
Maquilhagem: Giuseppe Annunziata, Giuseppe Banchelli, Ada Palombi, Amalia
Paoletti, Giancarlo De Leonardis; Direcção de produção: Claudio Mancini,
Alfredo Melidoni, Jone Tuzi; Assistentes de realização: Luisa Alessandri,
Franco Indovina, Franco Montemurro; Som: Vittorio De Sisti; Ennio Sensi;
Efeitos especiais: Stefano Ballirano, Stefano Camberini; Companhias de
produção: Compagnia Cinematografica Champion, Les Films Concordia (Paris); Intérpretes: Sophia Loren (Filumena
Marturano), Marcello Mastroianni (Domenico Soriano), Aldo Puglisi (Alfredo),
Tecla Scarano (Rosalia), Marilù Tolo (Diana), Gianni Ridolfi (Umberto),
Generoso Cortini (Michele), Vito Moricone (Riccardo), Rita Piccione (Teresina),
Lino Mattera, Alfio Vita, Alberto Castaldi, Anna Santoro, Enza Maggi, Mara
Marilli, Antonietta D'Onofrio, Raffaello Rossi Bussola, Vincenzo Aita, Vincenza
Di Capua, Pia Lindström, etc. Duração:
102 minutos; Distribuição em Portugal (DVD): Lusomundo Audiovisuais;
Classificação etária: M12 anos.
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