ROBERTO
ROSSELLINI (1906-1977)
Roberto Gastone Zeffiro Rossellini nasceu em Roma, a 8 de
Maio de 1906 e viria a falecer na mesma cidade, a 3 de Junho de 1977, com 71
anos. Casado com Assia Noris (1934-1936, anulado), Marcella De Marchis
(1936-1950, divórcio), Ingrid Bergman (1950-1957, divórcio) e Sonali Senroy
DasGupta (1957-1977, morte de Rossellini). Filhos: Romano Rossellini, Renzo
Rossellini (segundo casamento), Roberto Rossellini, Isabella Rossellini, Isotta
Rossellini (terceiro casamento), Gil Rossellini (quarto casamento).
Habitando na Via Ludovici, originário de uma família da
média burguesia romana, onde a música, o teatro e a cultura em geral tinham
destacado lugar, Roberto Rossellini tinha como pai Angiolo Giuseppe Rossellini,
conhecido como Beppino Rossellini, um notório arquitecto, senhor de certo
prestígio e fortuna, que beneficiava ainda do apoio de um rico tio empresário,
Roberto Zeffiro Rossellini. Beppino era também dado às artes e construiu em
Roma um teatro onde se podia igualmente projectar filmes - diz-se que foi mesmo
a primeira sala romana com esta ambivalência. O Cinema Barberini, inaugurado em
1930, projectado por Marcello Piacentini, e ainda hoje aberto ao público, agora
em sala multiplex, depois de algumas obras, fica localizado na Piazza
Barberini, perto do famoso Hotel Bristol, ao lado da Via Veneto, tendo em
frente a fonte do Tritão, da autoria de Bernini.
O jovem Roberto Rossellini, que tinha três irmãos mais
novos, Renzo, Marcela e Micaela, assistia, portanto, a tudo quanto passava
nessa sala, ganhando o gosto pelo cinema. O seu primeiro emprego, ainda jovem,
foi como captador de som para filmes, passando depois a outras tarefas na mesma
área, tendo ganho experiência que lhe foi decisiva no futuro.
Fala-se de um primeiro casamento com uma actriz de origem
russa, mas naturalizada italiana, Assia Noris, mas foi declarada a nulidade do
mesmo. Em 1936, casa com Marcella de Marchisqui, figurinista, especializada
sobretudo em guarda-roupa para cinema. Deste casamento nasceram dois filhos,
Marco Romano (1937) e Renzo (1941), o primeiro dos quais morreu tragicamente,
com um ataque de apendicite, enquanto criança ainda. O filme “Germania, Anno
Zero” era dedicado a esse filho, Romano.
Outra curiosidade importante para situar o percurso
biográfico do futuro cineasta foi o facto da casa dos pais se encontrar perto
do hotel de Benito Mussolini. Roberto privou desde jovem com Vittorio
Mussolini, filho do ditador, que mais tarde teria um importante papel na
condução da cinematografia italiana, sob a inspiração fascista. A estreia de
Rossellini na realização dá-se em curtas-metragens, “Daphne” (1936), a que se
seguiram, em 1938, “Prélude à l'Après-midi d'un Faune”, proibida pela censura,
acusada de falta de pudor, e, em 1939, “Fantasia Sottomarina”. Em 1938, foi
assistente de Goffredo Alessandrini na escrita de “Luciano Serra pilota”, que
ganha o Prémio Mussolini para o melhor filme italiano, no Festival de Veneza, e
teve um enorme sucesso de público. Em 1940, foi assistente de Francesco De
Robertis na realização de “Uomini sul Fondo”. Passa então à realização,
assinando três obras de propagando fascista que se inscrevem na sua filmografia
como a “Trilogia Fascista” (1941-1944) (curiosamente, um texto publicado nos
“Cahiers du Cinéma”, intitulado “Dix ans de Cinéma”, passa em claro este
período e estas obras): “La Nave Bianca” (1941), é uma encomenda do Centro
Cinematográfico do Ministério da Marinha, que ganhou o Prémio do Partido
Fascista, “Un Pilota Retorna” (1942) e “Uomo dalla Croce” (1943). Por essa
época, estabelece-se uma forte amizade com Federico Fellini e o actor Aldo
Fabrizi.
Quando o regime fascista começa a desmoronar-se, em fins de
1943, dois meses antes da queda de Roma, Rossellini começa a preparar as
filmagens de “Roma, Città Aperta”, com a colaboração de Fellini e de Aldo
Fabrizi, que irá interpretar o principal papel masculino, ao lado de Anna
Magnani. O filme, produzido pelo próprio, com economias pessoais e empréstimos,
estreia em 1945, passa relativamente desapercebido na estreia italiana, mas
recebe o Grande Prémio de Cannes e é triunfalmente acolhido em França e nos
EUA, sucesso que se reflecte então em Itália.
Em 1946, realiza “Paisà”, com actores não profissionais, e
em 1948 “Germania anno zero”, filmado no sector francês de Berlim, produzido
por um francês. Continua a preferir trabalhar com actores não profissionais e
explica a razão: “Para criar uma personagem que temos em mete é necessário ao
argumentista estabelecer uma verdadeira batalha com o actor, que muitas vezes
acaba com o argumentista a submeter-se aos desejos do actor. A fim de não
delapidar a minha energia numa batalha como essa, escolho actores profissionais
apenas de tempos a tempos”.
Rossellini roda seguidamente “L'Amore” (que compreende dois
filmes de média metragem, “La Voix Humaine”, segundo Cocteau, e “Le Miracle”,
segundo Fellini), de novo com Anna Magnani, com quem estabeleceu uma tumultuosa
relação amorosa, e “La Macchina Ammazzacattivi”.
Em 1948, Rossellini recebe uma carta de Ingrid Bergman, que
na altura tinha Hollywood aos pés, sobretudo depois de “Casablanca”. Rezava
assim: “Caro M. Rossellini, Vi os seus filmes “Roma, Cidade Aberta” e “Païsa”,
e gostei muito deles. Se tiver necessidade de uma actriz sueca que fala muito
bem inglês, que não esqueceu o seu alemão, que não se faz compreender muito bem
em francês, e que em italiano nada mais sabe dizer senão “ti amo”, então eu
estou pronta a ir fazer um filme consigo”. Assinava, Ingrid Bergman. Sem pensar
duas vezes, presumo eu, Rossellini convida Ingrid Bergman para interpretar
“Stromboli, Terra di Dio”, cujas filmagens decorreram na isolada ilha de
Stromboli. Era o primeiro título de um novo ciclo, este dedicado a Ingrid
Bergman, e que, além de “Stromboli” agrupa ainda “Europa 51”, “Viaggio in
Italia”, “O Medo” e “Giovanna d'Arco al Rogo”. Era igualmente o início de um
idílio que iria dar muito que falar. Rossellini e Ingrid eram casados, a sua
relação deu brado por todo o mundo, a actriz ficou grávida, sob as fagulhas do
Stromboli, as ligas de decência insurgiram-se, a América ficou chocada,
repudiaram os adúlteros, e Ingrid Bergman ficou na lista negra de Hollywood.
Casaram-se em 1950. O romance durou sete anos. Em 1957, Rossellini partiu para
a Índia, para rodar uma série de documentários para a televisão, e uma longa, e
aí conheceu uma argumentista indiana, Sonali Dasgupta, casada com um realizador
de documentários, mãe de filhos, e rebenta outro escândalo, este com uma
tonalidade muito oriental. O casal parte para Itália, Sonali traz o filho, que
Rossellini adopta, deixa a filha com o pai, e pouco depois nasce Gil
Rossellini. Viveram juntos até à morte de Rossellini, em 1977.
Cinematograficamente, os escândalos da vida pessoal e o
insucesso das obras para televisão arruinaram a reputação de Rossellini. Não
havia produtor que lhe concedesse liras para um filme, até que consegue rodar
“O General Della Rovere”, em 1959, uma obra-prima que ganha prémios em
festivais internacionais, Veneza finalmente!, e o projecta de novo como grande
mestre. Seguem-se “Era Notte a Roma”, de novo sobre a II Guerra Mundial, e duas
peliculas históricas, “Viva l’Italia” (1960) e “Vanina Vanini” (1961). Mas
Rossellini não gosta do “espectáculo”, prefere o cinema pedagógico e acerca-se
da televisão educativa para rodar uma série de documentários ficcionados sobre
personalidades históricas, como “L’ Etá del Ferro”, “Benito Mussolini”, “La
Prise du Pouvoir par Louis XIV” (excelente exercício), “La Lotta dell’Uomo per
la Sopravvivenza”, “Atti degli Apostoli”, “Socrate”, “La Forza e la Ragione”,
“Blaise Pascal”, “Agostino d’Ippona”, “L’Età di Cosimo de Medici”, “Cartesius”,
“Anno Uno”, “Il Messia”, entre outros. O seu derradeiro filme data de 1977, e documentava
“Beaubourg, Centre d’Art et de Culture George Pompidou”. Para lá do cinema e da
televisão, ainda encenou diversas peças de teatro, escreveu vários importantes textos
sobre cinema, e colaborou em argumentos para outros cineastas, nomeadamente para
Godard, “Les Carabininiers”.
Entre 1968 e 1974, dirigiu o Centro Sperimentale di
Cinematografia. Morreu em Roma, a 3 de Junho de 1977, com 71 anos, de crise
cardíaca.
FILMOGRAFIA:
Cinema
1935: DAFNE (curta-metragem)
1937: PRÉLUDE À L'APRÈS-MIDI D'UN FAUNE (curta-metragem)
1938: FANTASIA SOTTOMARINA (curta-metragem)
1939: LA VISPA TERESA (curta-metragem)
1940: IL TACCHINO PREPOTENTE (curta-metragem)
1941: IL RUSCELLO DI RIPASOTTILE (curta-metragem)
1941: LA NAVE BIANCA
1942: UN PILOTA RITORNA
1943: L'UOMO DALLA CROCE
1943: DESIDERIO (filme iniciado por Rossellini em 1943, com o título
"Scalo merci" e concluído em 1946 por Marcello Pagliero)
1945: ROMA, CITTÀ APERTA (Roma, Cidade Aberta)
1946: PAISÀ (Libertação)
1948: GERMANIA ANNO ZERO (Alemanha, Ano Zero)
1948: L'AMORE
1949: L'INVASORE, de Nino Giannini e Roberto Rossellini (supervisão)
1950: STROMBOLI TERRA DI DIO (Stromboli)
1950: FRANCESCO, GIULLARE DI DIO (O Santo dos Pobrezinhos)
1952: LA MACCHINA AMMAZZACATTIVI)
1952: I SETTE PECCATI CAPITALI (Pecados Mortais), de Yves Allégret,
Claude Autant-Lara, Eduardo De Filippo, Jean Dréville, Georges Lacombe, Carlo
Rim, e Roberto Rossellini (episódio “L’Envy” ou"L’Envie” )
1952: EUROPA '51 (Europa 51)
1953: SIAMO DONNE, de Gianni Franciolini, Alfredo Guarini, Roberto
Rossellini (episódio "Ingrid Bergman"), Luchino Visconti, Luigi Zampa
1953: RIVALITÀ, de Giuliano Biagetti e Roberto Rossellini (supervisão)
1954: DOV'È LA LIBERTÀ? (Onde Está a Liberdade?)
1954: VIAGGIO IN ITALIA (Viagem em Itália))
1954: ANGST (O Medo)
1954: AMORI DI MEZZO SECOLO, de Mario Chiari, Pietro Germi, Glauco
Pellegrini, Antonio Pietrangeli, Roberto Rossellini (episódio "Napoli
1943")
1954: GIOVANNA D'ARCO AL ROGO
1957: INDIA MATRI BUHMI (documentário)
1959: IL GENERALE DELLA ROVERE (O General Della Rovere)
1960: ERA NOTTE A ROMA (Era Noite em Roma)
1961: VIVA L'ITALIA (Viva Itália)
1961: VANINA VANINI (Vanina Vanini)
1962: ANIMA NERA
1963: RO.GO.PA.G., de Jean-Luc Godard, Ugo Gregoretti, Pier Paolo
Pasolini, Roberto Rossellini (episódio "Illibatezza")
1974: ANNO UNO
1976: IL MESSIA (O Messias)
Televisão
1959: L’INDIA VISTA DA ROSSELLINI (mini-série)
1961: TORINO NEI CENT'ANNI
1962: I CARABINIERI
1962: BENITO MUSSOLINI
1964: L'ETÀ DEL FERRO
1967: IDEA DI UN'ISOLA
1967: LA PRISE DE POUVOIR PAR LOUIS XIV (A Tomada do Poder por Luis
XIV)
1968: ATTI DEGLI APOSTOLI
1970: SOCRATE
1970: LA LOTTA DELL'UOMO PER LA SUA SOPRAVVENZA, de Renzo Rossellini
1970: DA GERUSALEMME A DAMASCO
1971: INTERVISTA A SALVADOR ALLENDE: LA FORZA E LA RAGIONE
1971: RICE UNIVERSITY
1971: BLAISE PASCAL
1972: AGOSTINO D'IPPONA
1973: L'ETÀ DI COSIMO DE MEDICI (mini-série)
1973: CARTESIUS
1974: A QUESTION OF PEOPLE, de Beppe Cino, “From filming by Roberto
Rossellini”
1974: CONCERTO PER MICHELANGELO
1977: BEAUBOURG, CENTRE D'ART ET DE CULTURE GEORGES POMPIDOU
Argumentista (em filmes que
não foram de sua autoria)
1938: LUCIANO SERRA PILOTA, de Goffredo Alessandrini
1963: LES CARABINIERS, de Jean-Luc Godard
1967: LA LUTTE DE L'HOMME POUR SA SURVIE
Algumas obras de cinema e
televisão onde aparece (testemunhos, entrevistas, biografias, etc.:
1959: L'India vista da
Rossellini (TV, mini-série de TV)
1960: Cinépanorama (Série de
TV, documentário)
1960: Project XX (Série de TV,
documentário)
1964: Roberto Rossellini:
appunti biografici (TV, documentário)
1965: L'età del ferro (Série
de TV, documentário)
1967: Toast of the Town (Série
de TV)
1973: Intervista a Salvador
Allende: La forza e la ragione (TV, documentário)
1973: Grierson (documentário)
1974: The World Population
(TV, documentário)
1975: Personenbeschreibung
(série de TV, documentário)
– Roberto Rosselini - ein
Mensch wie jeder andere (1975)
1979 Org
1980 Io sono Anna Magnani
(documentário)
1986 He Stands in the Desert
Counting the Seconds of His Life
1990 Arena (Série de TV,
documentário)
1992 Rossellini visto da
Rossellini (documentário)
1997 Addo' sta Rossellini?
(documentário)
1997 Birth of a Nation
(documentário)
2000 Roberto Rossellini:
Frammenti e battute (documentário)
2003 Histoires de fiction
2004 Épreuves d'artistes (TV,
documentário)
2006 Il était une fois...
(Série de TV, documentário)
2006 Kill Gil, Volume 2
(documentário)
2007 Rossellini - Bergman,
l'amour du cinéma (TV, documentário)
2008 Anna Magnani - Recitare
la verità (TV, documentário)
2010 Un cine como tú en un
país como éste (documentário)
2010 Gilles Jacob, l'arpenteur
de la croisette (TV, documentário)
2012 La guerra dei vulcani
(documentário)
Prémios principais:
1946: Grande Prémio, Festival
de Cannes, para “Roma, Cidade Aberta”
1947: “Nastri d'Argento”, do Sindacato
Nazionale Giornalisti Cinematografici Italiani, para Melhor Realizador para
“Libertação”.
1948: Grande Prémio e Prémio
de Melhor Argumento, no Festival de Locarno, para “Alemanha, Ano Zero”.
1948: NBR (National Board of
Review) para Melhor Realizador para “Libertação”.
1950: NYFCC (New York Film
Critics Circle) para Melhor Filme Estrangeiro para “L'Amore”
1950: Prémio “Kinema Junpo”,
de Melhor Filme Estrangeiro, para “Libertação”.
1952: Grande Prémio
Internacional de Veneza, no Festival de Veneza, para “Europe 51”
1959: Leão de Ouro, no
Festival de Veneza, para “O General Della Rovere”
1959: Prémio OCIC, no Festival
de Veneza, para “O General Della Rovere”
1960: “Nastri d'Argento”, do
Sindacato Nazionale Giornalisti Cinematografici Italiani, para Melhor
Realizador, para “O General Della Rovere”.
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