quarta-feira, 8 de abril de 2015

LUCHINO VISCONTI


LUCHINO VISCONTI (1906-1976)

Don Luchino Visconti di Modrone, conde de Lonate Pozzolo, nasceu em Milão, a 2 de Novembro de 1906 e faleceu em Roma, de 17 de Março de 1976, e era descendente da aristocrática família milanesa dos Visconti. Filho de Giuseppe Visconti de Modrone, duque de Grazzano, e de Carla Erba (proprietária e herdeira de uma célebre empresa farmacêutica), Luchino tinha mais seis irmãos. Os pais eram apaixonados pelo teatro e tinham em casa uma sala reservada para encenações familiares, onde intervinham igualmente alguns amigos. Luchino prestou o serviço militar como sub-oficial de cavalaria em 1926, no Piemonte, e viveu os anos de sua juventude cuidando dos cavalos na sua propriedade. Além disso, era frequentador assíduo de ópera e admirador da estética do melodrama, ambas influências notórias na sua actividade futura.
O seu interesse pelo espectáculo é pois longínquo. O ingresso no cinema data de 1936, quando em França a sua amiga Coco Chanel o apresentou a Jean Renoir que o convidou a trabalhar no seu filme "Une Partie de Campagne". Em 1937 passou por Hollywood antes de retornar a Roma. Na capital italiana voltou a trabalhar com Renoir na direcção de “La Tosca”.
A partir de 1940 ligou-se aos intelectuais que editavam e dirigiam o jornal “Cinema” e vendeu jóias da família para realizar seu primeiro filme, "Ossessione", em 1943, com Clara Calamai e Massimo Girotti. No fim da II Guerra Mundial realizou o segundo filme, o documentário "Giorni di Gloria". Aristocrata por nascimento, mas comunista por convicção, foi contratado pelo Partido Comunista Italiano para realizar três filmes sobre pescadores, mineiros e camponeses da Sicília, acabou por fazer apenas um, "La Terra Trema".
Depois, em 1951, roda "Bellissima" com Anna Magnani, Walter Chiari e Alessandro Blasetti. O seu primeiro filme a cores data de 1954, "Sentimento" (Senso) com Alida Valli e Farley Granger. O grande prémio da crítica chega em 1957, quando recebe o Leão de Ouro do Festival de Cinema de Veneza por "Le Notti Bianche", uma transposição delicada e poética de uma história de Dostoievski com Marcello Mastroianni, Maria Schell e Jean Marais.
O primeiro grande sucesso de crítica e de público ocorreria em 1960 com "Rocco e seus Irmãos", a saga de uma humilde família de calabreses que emigrava para Milão. Foi o filme que consagrou o actor francês Alain Delon ao lado de Annie Girardot e Renato Salvatori. No ano seguinte junta-se a Vittorio De Sica, Federico Fellini e Mario Monicelli no filme em episódios "Boccaccio '70. O episódio de Visconti é protagonizado por Tomas Milian, Romy Schneider, Romolo Valli e Paolo Stoppa.
Em 1963 dirige o seu maior sucesso comercial e, simultaneamente, um dos filmes mais elogiados pela crítica, o magnifico "O Leopardo", extraído do romance homónimo de Giuseppe Tomasi di Lampedusa, vencedor da Palma de Ouro do Festival de Cannes, onde se destacam Burt Lancaster, Claudia Cardinale e Alain Delon.
“Sandra”, um mergulho inquieto e melancólico na capacidade de seres sensíveis se destruírem amorosamente, com Claudia Cardinale e Jean Sorel, realizado em 1965, foi a obra seguinte. Em 1970 ele conhece o fracasso de uma obra sua, “O Estrangeiro”, extraído do romance homónimo de Albert Camus e realiza também "Os Malditos" (La Caduta degli Dei) que lançou o actor Helmut Berger, a partir dai seu companheiro até à morte.
Com o sensível e refinado "Morte em Veneza" (1971), protagonizado por Dirk Bogarde e baseado na obra de Thomas Mann, volta a reencontrar-se com o êxito, ao abordar a história de Gustav Aschenbach, um compositor que vai passar férias em Veneza, e acaba por viver uma grande e inesperada paixão, que iniciaria a sua destruição. O filme faz uma abordagem do conceito filosófico de beleza, assim como da passagem do tempo e da importância da juventude nas nossas vidas. O filme seguinte foi a super produção "Ludwig", com Helmut Berger e Romy Schneider. Durante a rodagem, sofre um ataque cardíaco que o prendeu a uma cadeira de rodas para sempre.
Mesmo em dificuldades, Luchino Visconti ainda realiza mais dois filmes, “Violência a Paixão” (Gruppo di Famiglia in un Interno) e “O Inocente” (L'Innocente), derradeira obra, versão do romance de Gabriele d'Annunzio que regista brilhantes interpretações de Giancarlo Giannini e Laura Antonelli. Já não concretiza um sonho de há muito, uma adaptação de “A la Recherche du Temps Perdue”, segundo obra de Marcel Proust. Morre na primavera de 1976 na sua residência na cidade de Roma. Na Ilha de Ischia existe um museu que lhe é inteiramente dedicado.
Marco Ferreri, em 1972, disse: "Luchino Visconti sempre foi um marxista convicto. Mas antes do mais, era um verdadeiro aristocrata". Nesta dicotomia ambígua, entre o aristocrata que nascera e o marxista que se fizera, iria oscilar grande parte da sua obra, do seu cinema, fascinando pelo requinte de certos ambientes, marcados, todavia, pela sua própria condenação.
A atenção do cineasta dirigia-se sobretudo para a decadência de alguns estratos sociais que definia de forma admirável. A decadência da aristocracia, que cede o seu lugar condutor à burguesia ascendente é o tema de "Sentimento" e de "O Leopardo". "Os Malditos" serviria de título à análise da ascensão e derrocada do nazismo. A falência do colonialismo francês na Argélia seria o cenário de "O Estrangeiro", retirado de um romance de Albert Camus. Mas a Alemanha das tragédias wagnerianas, das brumas dos Nibelungos, do expressionismo, onde a lucidez crítica e a loucura sempre se cruzaram, fascinava sobremaneira o cineasta que se sentia muito perto do mundo igualmente decadentista de Thomas Mann, de quem adaptou "Morte em Veneza". Poder, loucura e perversidade explicavam as orgias faustosas de "Luís da Baviera", que será possivelmente um dos filmes menos conseguido de toda a brilhante carreira de Visconti.
Desde o início da sua carreira, onde se testemunha a generosidade e a coragem de um esteticista de uma cultura invulgar e de uma formação objectivamente elitista que consegue chegar ao povo e dele falar como se do povo tivesse saído, Visconti se interessa, sem recurrer à demagogia fácil, por assuntos de características sociais, como foi o caso dos pescadores sicilianos em "A Terra Treme", da alienação popular  pelo "sonho do cinema" em "Belíssima", ou desse majestoso painel dedicado a uma família de italianos do Sul transplantados para Milão, onde as condições de sobrevivência impõem a desagregação mais completa, em "Rocco e os seus Irmãos".
"Os meus filmes contam por vezes histórias de famílias, da sua autodestruição, da decomposição dessas famílias ("O Leopardo", "Os Malditos"...) Conto essas histórias como contaria um "réquiem" , porque me parece mais justo e mais oportuno contar tragédias. Nos meus filmes, as relações humanas atingem o ponto máximo de exasperação". Isto disse Visconti que confessaria igualmente: "Tenho da decadência uma opinião muito favorável, como a tinha, por exemplo, Thomas Mann. Estou imbuído dessa decadência. Mann é um decadente da cultura germânica, eu da cultura italiana. O que me interessou sempre foi o exame de uma sociedade doente".
Tal como o conde de Salinas, Visconti desprendeu-se da sua classe porque consegue possuir a lucidez necessária para se saber condenado a desaparecer, enquanto elemento de um escol moribundo. Retirando uma lição da História de que tanto se serviu Visconti, como "O Leopardo", de Lampedusa, sabe que a História não pára. Enquanto "O Leopardo" propunha concessões e alianças para que "mudando o acidental, tudo permanecesse na mesma", Visconti prepara os novos tempos, não recuando perante o seu "haraquiri" social. O que encenou por várias vezes com certa voluptuosidade e uma inteligência inultrapassável.

Filmografia

Como realizador de longas-metragens de ficção:
1943: OSSESSIONE (Obsessão)
1948: LA TERRA TREMA (A TerraTreme)
1951: BELLISIMA (Belissima)
1953: SIAMO DONNE (Nós, Mulheres) (episódio “ANNA MAGNANI”) 
1954: SENSO (Sentimento)
1957: LE NOTTI BIANCHE (Noites Brancas)
1960: ROCCO I SUOI FRATELLI (Rocco e os Seus Irmãos)
1961: BOCCACCIO '70 (Boccaccio ’70) (episódio “IL LAVORO”) 
1963: IL GATTOPARDO (O Leopardo)
1965: VAGHE STELLE DELL'ORSA... (Sandra)
1966: LE STREGHE (A Magia da Mulher) (episódio “LA STREGA BRUCIATA VIVA”)
1967: LO STRANIERO (O Estrangeiro)
1969: LA CADUTA DEGLI DEI (Os Malditos)
1971: MORTE A VENEZIA (Morte em Veneza)
1973: LUDWIG (Luís da Baviera)
1974: GRUPPO DI FAMIGLIA IN UN INTERNO (Violência e Paixão)
1976: L'INNOCENTE (O Intruso)

Como realizador de documentários:
1945: GIORNI DI GLORIA
1951: DOCUMENTO MENSILE N. 2, episódio “APPUNTI SU UN FATTO DI CRONACA”
1970: ALLA RICERCA DI TADZIO (televisão)

Como assistente de realização:
1936: UNE PARTIE DE CAMPAGNE, de Jean Renoir
1940: LA TOSCA, de Carl Koch e Jean Renoir

Teatrografìa
Como colaborador
CARITÀ MONDANA, de Giannino Antona Traversi (1936) decorador
IL DOLCE ALOE (Sweet Aloes), de Jay Mallory (1936) decorador
IL VIAGGIO (Le Voyage) de Henry Bernstein (1938) decorador (não creditado)
VITA COL PADRE (Life with  Father), de Howard Lindsay e Russel Crouse (1947) supervisor e empresário
FESTIVAL, de Age, Furio Scarpelli, Dino Verde, Orio Vergani (1954) supervisor

Como encenador
PARENTI TERRIBILI (Les Parents Terribles), de Jean Cocteau (1945)
QUINTA COLONNA (Ther Fifth Column), de Ernest Hemingway (1945)
LA MACCHINA DA SCRIVERE (La Machine à Écrire), de Jean Cocteau (1945)
ANTIGONE (Antigone), de Jean Anouilh (1945)
A PORTE CHIUSE (Huis Clos), de Jean-Paul Sartre (1945)
ADAMO (Adam), de Marcel Achard (1945)
LA VIA DEL TABACCO (Tobacco Road), de John Kirkland (sobre romance de Erskine Caldwell) (1945)
IL MATRIMONIO DE FIGARO (La Mariage de Figaro), de Pierre Augustin Caron De Beaumarchais (1946)
DELITTO E CASTIGO (Crime et Châtment), de Gaston Bary (sobre romance de Dostoevskij) (1946)
ZOO DE VETRO (The Glass Menagerie), de Tennessee Williams (1946)
EURIDECE (Eurydice), de Jean Anouilh (1947)
ROSALINDA O COME VI PIACE (As You Like It), de William Shakespeare (1948)
UN TRAM CHE SI CHIAMA DESIDERIO (A Streetcar Named Desire), de Tennessee Williams (1949)
ORESTE, de Vittorio Alfieri (1949)
TROILO E CLESSIDRA (Troilus and Cressida), de William Shakespeare (1949)
MORTE DE UN COMMESSO VIAGGIATORE (Death of a Salesman), de Arthur Miller (1951)
UN TRAM CHE SI CHIAMA DESIDERIO (A Streetcar Named Desire), de Tennessee Williams (1951)
IL SEDUTTORE, de Diego Fabbri (1951)
LA LOCANDEERA, de Carlo Goldoni (1952)
TRE SORELLE (Tri sestry), de Anton Tchechov (1952)
IL TABACCO FA MALE (O Vrede Tobaka), de Anton Tchechov (1953)
MEDEA (Medeia), de Euripide (1953)
COME LE FOGLIE, de Giuseppe Giacosa (1954)
IL CROGIUOLO (The Crucible), de Arthur Miller (1955)
ZIO VANIA (Djadja Vanja), de Anton Tchechov (1955)
CONTESSINA GIULIA (Froken Julie), de August Strindberg (1957)
L'IMPRESARIO DELLE SMIRNE, de Carlo Goldoni (1957)
UNO SGUARDO DAL PONTE (A View from the Bridge), de Arthur Miller (1958)
IMMAGINI E TEMPI DE ELEONORA DUSE, de Gerardo Guerrieri (1958)
VEGLIA LA MIA CASA, ANGELO (Look Homeward, Angel), de Ketti Frings (sobre romance de Thomas Wolfe) (1958)
DEUX SUR LA BALANÇOIRE (Two for the Seesaw), de William Gibson (1958)
I RAGAZZI DELLA SIGNORA GIBBONS (Mrs. Gibbon’s Noys), de Will Glickman e Joseph Stein (1958)
FIGLI D'ARTE, de Diego Fabbri (1959)
L'ARIALDA, de Giovanni Testori (1960)
DOMMAGE QU'ELLE SOIT UNE P... (Tis Pity She’s a Whore), de John Ford (1961)
IL DIAVOLO IN GIARDINO, de Luchino Visconti, Filippo Sanjur e Enrico Medioli (1963)
IL TREDECESIMO ALBERO (Le Treziéme Arbre), de André Gide (1963)
APRES LA CHUTE (After the Fall), de Arthur Miller (1965)
IL GIARDENO DEI CILIEGI (Visnevyj Sad), de Anton Tchechov (1965)
EGMONT, de Wolfgang Goethe (1967)
LA MONACA DE MONZA, de Giovanni Testori (1967)
L'INSERZIONE, de Natalia Ginzburg (1969)
TANTO TEMPO FA (Old Times), de Harold Pinter (1973)

Encenação de óperas:
LA VESTALE, de Gaspare Spontini (1954)
LA SONNAMBULA, de Vincenzo Bellini (1955)
LA TRAVIATA, de Giuseppe Verdi (1955)
ANNA BOLENA, de Gaetano Donizetti (1957)
IFIGENIA IN TAURIDE, de Christoph Willibald Gluck(1957)
DON CARLO, de Giuseppe Verdi (1958)
MACBETH, de Giuseppe Verdi (1958)
IL DUCA D'ALBA, de Gaetano Donizetti (1959)
SALOMÉ, de Richard Strauss (1961)
IL DIAVOLO IN GIARDINO, de Franco Mannino (sobre um libretto de Visconti, Filippo Sanjust e Enrico Medeoli, 1963)
LA TRAVIATA, de Giuseppe Verdi (1963)
LE NOZZE DE FIGARO, de Wolfgang Amadeus Mozart (1964)
IL TROVATORE, de Giuseppe Verdi (1964)
IL TROVATORE, de Giuseppe Verdi (1964) (nova versão)
DON CARLO, de Giuseppe Verdi (1965)
FALSTAFF, de Giuseppe Verdi (1966)
DER ROSENKAVALIER, de Richard Strauss (1966)
LA TRAVIATA, de Giuseppe Verdi (1967)
SIMON BOCCANEGRA, de Giuseppe Verdi (1969)
MANON LESCAUT, de Giacomo Puccini (1973)

Encenação de bailado:
MARATONA DE DANZA, com libreto de Luchino Visconti

Principais prémios:
Nomeação para o Oscar de Melhor Argumento Original, por "La Caduta degli dei" (1969).
Nomeação para o BAFTA de Melhor Realizador, por "Morte a Venezia" (1971).
Dois Prémios Bodil de Melhor Filme Europeu, por "Rocco e i suoi fratelli" (1960) e "Morte a Venezia " (1971).
Palma de Ouro no Festival de Cannes, por "Il Gattopardo" (1963).
Prémio do 25º Aniversário no Festival de Cannes, por "Morte a Venezia" (1971).
Leão de Ouro no Festival de Veneza, por "Vaghe stelle dell'Orsa...” (1965).
Leão de Prata no Festival de Veneza, por "Le Notti bianche" (1957).
Prémio Especial no Festival de Veneza, por "Rocco e i suoi fratelli" (1960).

Prémio FIPRESCI no Festival de Veneza, por "Rocco e i suoi fratelli" (1960). 

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